“Quem terá sido o génio que achou que precisaria de companhia num momento destes?” Não consigo evitar pensar isto, quando sinto em cima do meu ombro direito um ligeiro bafejo, suficiente para entrar pelas minhas narinas. Um cheiro a cerveja e pastilha elástica de mentol faz-me semicerrar os olhos. Por segundos esqueço o que tenho em mãos. “Por favor, pode não me intoxicar? Estou a tentar não deixar ninguém morrer hoje!” Abri a boca para dizer isso, mas pelo contrário, pressiono os meus lábios contendo a frustração e, ainda que não queira admitir, o medo. Sinto as minhas bochechas a ruborizar e a respiração encurtar, quando olho para aquela caixa preta, cheia de fios. Cinco minutos. Os algarismos do contador ficam turvos, e quase consigo ignorar o gigante de um metro e noventa, que começa a pingar suor nas minhas costas. Ao mesmo tempo que faço cálculos e observo a ligação elétrica, os meus pais invadem-me o pensamento. Eles nunca quiseram que a princesa deles entrasse para a brigada de minas e armadilhas. E aqui estou eu, com as mãos trémulas, a tentar evitar que, num local onde se salvam vidas, elas se percam. Dois minutos. O meu coração acelera, os batimentos cardíacos deixam de acompanhar os segundos do relógio. Os sons das sirenes ecoam nos meus ouvidos, ao mesmo tempo que ouço a respiração ofegante do homem que me acompanha. “Será este o fim?” Sacudo a cabeça deste pensamento. Um minuto. Corto o fio lilás. Grito! Com a mesma força de um recém-nascido que conhece pela primeira vez o mundo. Zero. Aninhada, aperto com força as minhas pernas. Sinto-as a libertarem-se, enquanto abro lentamente os meus olhos, para conseguir ver o painel daquela caixa, desligado. Viro-me em direção à porta de emergência, e encontro, completamente endurecido e com o olhar vazio, o mesmo homem que esteve comigo mais de seis horas. Observo uma lágrima pesada, a escorrer pela sua cara pálida. Sorrio, e solto um suspiro libertador. Olho para as minhas mãos, e penso. “Hoje, não deixei ninguém morrer.”
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